Thursday, May 31, 2012

Portugal das 5 quinas


Vem um dia e vem o vira,
outro dia é o malhão,
o fandango, o corridinho,
são as danças do coração.

Há guitarras, cavaquinhos,
saias que voam em balão,
dançam os pares arrumadinhos,
trocam os lenços de mão.

Os pares rodam e as chinelas
vão ao centro e mais além,
riem-se os olhos, vaidosos,
este orgulho quem não têm?

fotografia de Paula Vilela              

Sunday, May 27, 2012

todos os dias - 1



o homem dos bigodes
o mesmo todos os dias
e da bata semi-branca
a mesma de todos os dias
impassível aos olhares
os mesmos de todos os dias
sobe e desce no buraco
em qualquer dia
de onde renasce algo novo
em qualquer dia
uma esperança em cada ida
amanhã também é dia
é esta sina que carrego
todos os dias
nas caixas que descarrego
todos os dias
pesadas de tantos anos
e tantos dias
 (...)

Tuesday, May 22, 2012

um fado português


dia a dia trabalhamos o outro fado
sem ouvintes em silêncio murmuramos
um sopro aqui e além desafinamos
no esforço de compor um melhor fado

desperta a madrugada noutras cordas
duro trabalho para escutar a melodia
que mais tarde já em casa ao fim do dia
repousará algumas horas entre portas

lado a lado neste coro nesta orquestra
ao cantar a nova forma da canção
a compasso construímos a casa e o pão
da abundância na nossa mesa em festa 

a história destas vidas e as histórias
das horas longas umas mais que outras
nos ensinam que o futuro está nas mãos
de quantos a este fado derem voz

a vida é um fado só longo é o dia
até ao sol pôr na noite a dor perdura
mas pela manhã se levanta um novo fado
e há quem diga que é um fado português 

Wednesday, May 16, 2012

o relógio

 
Em frente há horas grandes, um relógio grande que é ponte
("está parado - diz ela - desde não sei quando!...")
(vou pô-lo a trabalhar, acertar os minutos e os passos)
que em frente há mais tempo, mais cidade
(nunca lá fui - acrescentava - dizem que para lá não se dorme... !?)
A cidade é que está viva, como os sonhos, a cidade é que não dorme...




os meus filhos nasceram aqui


os meus filhos nasceram aqui. eu nasci aqui
porque eu nasci muitas vezes.

atravesso a ferry street. comigo, a minha memória
atravessa a ferry street.

sou feito de sangue e de memória. as palavras
pararam dentro de mim. as palavras misturaram-se
comigo.

portugal dito em inglês. a estrada que chega e
que parte da minha terra, dita em inglês.
memória: my mother, her fingers touching my
face, her lips saying words: filho.

atravesso a ferry street. comigo, a minha memória
atravessa a ferry street.

portugal. sou feito do teu rosto. nascemos juntos.

memória: my country, my trees and my eyes.
my blood.

atravesso a ferry street. comigo, portugal
atravessa a ferry street.

os meus filhos nasceram aqui.
eu nasci aqui.
eu nasci muitas vezes.
 José Luis Peixoto

Monday, May 14, 2012

Rua da Palavra - Luso Americano - Newark



Ricardo Durães - Luso Americano - Newark, NJ - 11 de Maio 2012


Saturday, May 12, 2012

... o sonho escondido


  
Quem perde no sonho o sonho perdido,
re-volta, regressa, resiste, re-sonha,
vence no futuro distâncias medonhas,
e volta a sonhar o sonho escondido.

Thursday, May 10, 2012

o tempo das cidades - 2



Um comboio e um relógio e uma rua pelo meio...
um antes do comboio e das linhas de ferro,
outro mundo para lá do relógio, das pontes, do rio, do mar.

o tempo das cidades - 1



para lá dos ponteiros parados o tempo não pára
e as portas abrem-se às cidades que não dormem



Sunday, May 6, 2012

preâmbulo 1


antes que seja tarde, repetias
como quando te escutava pela tarde
dizer tantas vezes: vem, vem
meu tempo, que te espero,
antes da tarde

e enquanto há tempo para escutar
o vento e as vozes desse tempo,
dessa tarde que antecede o outro vento
e ele narra o pensamento nas palavras ...

quero correr o mundo enquanto é tempo
na ânsia de vencer o instante e o momento
em que já pouco restará da história; pela tarde

lançarei a minha voz solta no vento
acalmarei a centelha que por dentro arde
e beijarei uma vez mais a vida

antes que seja tarde...


Friday, May 4, 2012

RUA DA PALAVRA


palavra de rua palavras na rua

palavra que é minha palavra que é tua 

palavra quebrada o corpo é que sua

palavra da noite pintada na lua

palavra de amor ou palavra nua

palavra que é o nome da rua

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                              Fotografia de Paula Vilela